Um amigo (Dalmo Amorim) foi morar no México e eu não poderia perder esta oportunidade. Pedi que ele enviasse fotografias e informações sobre o que achasse interessante por lá. Egoísmo seria ficar com tantas imagens bacanas só para mim. Então lá vai...
Diz aí Dalmo o que tem de interessante pra gente?
Fotografias e texto enviados por Dalmo Amorim - Chefe escoteiro, membro da AQUA - Amigos da Quadra, e ex-morador do Condomínio Costa do Atlântico no Costa Azul. Dalmo foi para o México porém não se esqueceu dos amigos que fez em nosso bairro.
Abaixo fotografias aéreas de vulcões.
No Parque La Venta, estão estátuas, templos e cabeças Olmecas esculpidas em rocha vulcânica, algumas com 3.000 anos de idade.
Dalmo se empolgou e quase nos escreve um livro... palavras vindas do México pela rede mundial de computadores.(Do Correspondente Local)
México, Japão, Polinésia
Tenho o hábito de olhar fisicamente as pessoas, tentando entendê-las pelos traços que carregam. Assim, tentando entender e decifrar os mexicanos de Villahermosa, estado de Tabasco, para onde me mudei há quatro semanas, por vezes tenho a impressão nítida de que estou olhando para japoneses ou asiáticos, tal a semelhança de muitos deles!
Isto me faz lembrar da teoria de que os polinésios chegaram à América pelo Oceano Pacífico, e que seus descentes estão bem aqui: cabelos negros e lisos, estatura baixa, olhos puxados e negros. Principalmente as mulheres, algumas são muito parecidas com orientais, outras são bem mexicanas, indisfarçáveis!
Há pouca miscigenação ainda nesta região, parecem-se uns com os outros, como são parecidos os baianos para quem chega a Salvador pela primeira vez.
Nicte-Ha, México
Buscando na internet o significado de Nicte-Ha, descobri que se trata de um vilarejo turístico a 100 km de Cancún. Na realidade conheci este curioso nome porque a garçonete de um restaurante onde costumo almoçar disse chamar-se Nicte-Ha. Elas se apresentam com roupas coloridas, dizem o nome e informam que vão me atender ao chegarmos. Perguntei se era um apelido, porém e ela disse tratar-se de um nome maia, sem saber a origem. É uma jovem mulher de 22 anos, uma típica trabalhadora de classe média baixa.
Villahermosa, Arábia
Aqui faz um calor impressionante. Devido à imensa área do estado coberta por lagos e rios, a umidade do ar também é alta, do mesmo modo que em Salvador. Porém, quando o dia está quente, sente-se uma terrível opressão de 39° ou 40°. As pessoas somem das ruas, vão almoçar. O horário de almoço por aqui é das 14:00 h às 16:00 h. Estranho horário, quando chega 11:30 h da manhã estou morto de fome, tem sido difícil suportar até este horário e só o consegui uma vez. A resposta está em que come-se muito bem ao despertar, mas come-se pouco às 10:00 h da manhã, quando um taco ou outra comida segura o nível de produtividade alto até à hora do calor. No almoço então começa-se com uma pequena sopa para acalmar o estômago, seguindo-se um prato mixto de feijão prêto "pisado", abacate, carne, arroz, salada. A ceia é tomada lá pelas 20 - 21 horas, quando as pessoas estão chegando em suas casas.
Villahermosa, Suíça
Tendo vivido 25 anos em Salvador, uma coisa saltou-me aos olhos assim que cheguei aqui: a pobreza estava invisível, e esteve escondida por muitos dias, até eu conseguir notá-la. Não há pessoas pedindo esmolas, não há maltrapilhos, e em 4 semanas vi apenas um homem descalço e sujo. As pessoas trabalham muito. No escritório da empresa americana para a qual trabalho há um jovem rapaz, de cerca de 22 anos, que trabalha como segurança no turno da noite. Ao me despedir outro dia disse para ele que tinha sorte ao trabalhar pela noite, devido ao terrível calor que fazia de dia, porém sua resposta me desconcertou: "eu é que escolhi, mas para eu poder completar minha faculdade". Estudante de engenharia ambiental, trabalha à noite e estuda de dia. Confesso que fiquei surpreso com a declaração. Já vir vários casos assim, aqui mesmo no hotel onde estou temporariamente, conversei com dois funcionários que trabalham no turno das 15 às 22:30 h para poderem estudar pela manhã. As pessoas aqui são trabalhadoras, muito determinadas, muitos trabalham de domingo a domingo, e quando questionados do porquê saírem de suas casas no domingo para irem ao escritório da empresa, dizem "é importante para ver como as coisas estão no campo". O mundo do petróleo funciona dia e noite, as empresas que dão assistência operacional estão sempre vigilantes, do mesmo modo que no Brasil com a Petrobrás, mas o nível de comprometimento destes trabalhadores é maior que o dos nossos. Eu que me considero uma pessoa que trabalha duro, estou me sentindo culpado, imaginem!
Villahermosa, Paraíso
Não ouço as pessoas comentarem nada de televisão, parece que não assistem, parece que não existe. A TV local é ruim e a de satélite fala de outro lugar, outro mundo, Estados Unidos, e não deste mundo daqui. Nossa TV brasileira é muito mais desenvolvida em termos de jornalismo, de apresentação de programas. Mas nenhuma coisa me fez até este momento sentir-me no paraíso como assistir uma corrida de Fórmula-1 sem a voz chata e o pé frio de Galvão Bueno! Como foi gratificante acompanhar as análises técnicas sem adivinhação de sabido, sem comentários impróprios, sem gracejos inoportunos. A bem da verdade, sobra-nos - brasileiros - comodismo e conformismo, em no mínimo não escrever ou reclamar, à TV que o contrata, para pedir que o transfira para onde só seus subordinados tenham que agüentá-lo, bem longe do público. A gente tem o que merece. O povo daqui trabalha muito, se eles têm sua Suíça é porque estão determinados a chegar lá.
Villahermosa, Iraque
O estado de Tabasco e parte de área de estados vizinhos, foi dominado pelos Olmecas. Mas isto foi entre 1200 AC e 400 AC, uma civilização que durou 800 anos, com seus milhares de habitantes de inúmeras cidades prósperas, seus deuses, suas músicas, roupas típicas, comidas, governantes. Depois vieram os Maias, e só uns 400 anos depois na Palestina nascia Jesus. Há três semanas visitei o Parque La Venta, onde estão estátuas, templos e cabeças Olmecas esculpidas em rocha vulcânica, algumas com 3.000 anos de idade. Não haviam nascido nem os bisavós de Jesus e a Espanha era um imenso matagal.
Com os Maias, floresceu outra civilização, que conheceu a astronomia, matemática, arquitetura, e que também teve seus mitos e medos, canções e festas, roupas, comidas e governantes. Tudo ia bem, até que uns 2.000 anos depois chegaram os espanhóis, para trazerem o conheciemento, para ensiná-los a serem felizes e conhecerem o Bem. Assim, portadores da verdade universal e impondo a adoração a um palestino de uma terra distante que desconheciam, a ferro e fogo dizimaram, mataram, destruíram esta civilização mas também outras que existiram nas Américas, tentando renegar ao esquecimento suas cidades, escritas, histórias. Salgaram e cauterizaram a felicidade anteriormente existente, substituindo-a por esta que muitos de nós aceitamos sem contestar que - agora e enfim - é a única e verdadeira. Do mesmo modo age-se no Iraque e no Afeganistão, destruindo uma cultura, seus monumentos, seu povo, suas crenças e governantes. Ainda que agora não fique tão claro qual seja o motivo, mas a história arrumará algum para justificar toda esta destruição.
Este foi o motivo porque me emocionei em conhecer Nicte-Ha, a porta-bandeira de uma socidadade que existiu, a dizer ao mundo que mesmo que esteja quase dizimado, seu povo não se entregou e não se entregará.
Salvador, Florida
Quando cheguei à Bahia, em 1982, eu também tinha o hábito de olhar para as pessoas, vendo nos habitantes de Salvador os homens e as mulheres que chegaram da África de barco, dias antes, que foram escravizados, quase aniquilados. Pessoas que ainda rezavam por seus deuses, orgulhavam-se das lutas de seus avós, contavam os mitos de seus ancestrais, cantavam as canções, preparavam as comidas típicas, davam seus nomes aos seus filhos. Filhos do Mali, de Ghana, do Congo, de Angola.
Com tristeza, em 2007 deixo uma cidade de negros mortos, de histórias esquecidas, cheia de gente de nomes modernos, roupas modernas, griffes, e muitas gente dividida entre as duas religiões que enxotaram os deuses africanos e do qual parece querer esconder-se o que restou, como se fosse crime ou vergonha ser africano.
De um lado os templos imensos, os vaticanos das igrejas dizimais, onde as pessoas desistem do encontro consigo mesmos, aceitando uma felicidade em outra vida, a eterna. Cauterizam e abandonam os deuses africanos, procuram se esquecer envergonhados das histórias de seus avós, permitindo-se - todavia - orgulharem-se de histórias de palestinos estranhos, brancos. Pisoteiam os túmulos de seus ancestrais, esquecem que são, bantos, zulus, malês. Sua música vai calando, seus tambores silenciando, suas histórias sendo esquecidas. Não foram os espanhóis ou portugueses, somos nós mesmos quem estamos apagando de nossa história os guerreiros negros.
De outro lado templos dizimais ainda maiores nos fazem esquecer das religiões arcaicas, promentendo nova felicidade, anestesiando os discípulos que nele entram, para que gastem o dinheiro de seu trabalho, mas que voltem a trabalhar felizes, desde que retornem a deixar seu dízimo. No fundo é tudo igual, dinheiro e poder.
Salvador, Bahia
Felizmente Salvador tem praias, onde pode-se encontrar a natureza, esta sim nossa mãe, nossa deusa, nossa protetora. Povo amigo, lugares lindos, daqui levo apenas e a imensa felicidade interior que vivenciei nestes 25 anos. À vida agradeço, tanto que por aqui quero ficar, depois que minha vida terminar. Nada de felicidade na vida eterna, felicidade na vida agora.
Minhas cinzas, que as joguem no mar do Jardim de Alá.